BINGO: O REI DAS MANHÃS

Artur Duarte de Moraes Setembro de 2022 Crítica
Uma maquiagem pesada, roupa exagerada e uma peruca engomada e volumosa – essa é a parte fácil para criar um palhaço – o problema é quem usará todo esse adorno

Na década de 1980, o desafio era ainda maior. Não era suficiente ser apenas um palhaço, era necessário ser o Bozo! Ser o Bozo era se enquadrar nos rigorosos critérios de Alan Livingston, seu criador, que com tal feito, conquistou os Estados Unidos, México, Tailândia, Austrália, Grécia e Brasil. Como a marca Bozo é um direito autoral registrado, o diretor Daniel Rezende optou por retratá-lo no filme como Bingo.

Entre tantos atores que exerceram o papel, o filme retrata seu precursor e principal responsável pela consolidação do personagem, o ator Augusto Mendes, interpretado por Vladimir Brichta. Não é um documentário, mas ainda mostra como a ascensão de Mendes levou o público telespectador aos programas matinais.

Diante da hegemônica Rede Globo, que criou a “rainha dos baixinhos”, o maior objetivo de investimento do SBT era menos grandioso do que a liderança.

Contrariando as expectativas, o fenômeno do palhaço norte-americano, adaptado à realidade brasileira, competiu pela liderança de igual para igual em uma época que a hegemonia da Globo era ainda maior do que hoje. Essa competição seria boa para a televisão brasileira, pois criaria um campo de atuação mais nivelado, porém nem tudo foi positivo nessa atração infantil.

Sem muita consideração sobre como o conteúdo é apresentado às crianças, as emissoras fizeram todos os esforços para garantir a audiência usando sensualidade ou qualquer outro meio sem escrúpulos em apelo. Eles usaram cinicamente essas táticas para competir com outros canais por pontos na disputa.

Em pouco tempo ficou evidente que o palhaço era apenas uma peça do capital. Levado a acreditar que estava no controle, Augusto Mendes fez a parte mais difícil do trabalho, emplacando uma atração nova e desconhecida, cativando pequenos telespectadores e os influenciando para comprar seus produtos, ele cumpriu com perfeição suas responsabilidades de representar o capital com expertise.

Dentro da lógica do lucro, Augusto foi substituído quando deixou de trazer apenas benefícios. Na guerra por audiência, o palhaço foi reduzido à maquiagem e roupa e, no fim, não importava quem dava as usava. Era mais benéfico substituir uma engrenagem danificada do sistema, que permitiria números maiores de patrocinadores e aos fabricantes de produtos com estampas do palhaço.

Adicionar um palhaço a um programa de TV pode levar a um programa de sucesso e a uma campanha publicitária lucrativa. No entanto, a arte milenar de atuar como palhaço acaba desviada e até desvirtuada nas telas.

Ao fazer isso, não há mais o programa familiar de sair de casa e acompanhar um espetáculo. O palhaço passa a cumprir seu papel evitando que as crianças saiam de casa e mantendo todas em frente à televisão, com toda a comodidade e exposição ao marketing.

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